quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

SEGURO. VIDA. EMBRIAGUEZ.

"O contrato de seguro de vida destina-se a cobrir danos decorrentes de possíveis acidentes, geralmente em razão de atos dos próprios segurados nos seus normais e corriqueiros afazeres do dia a dia. Logo, a prova da concentração do teor alcoólico no sangue não se mostra suficiente para indicar a causalidade com o dano sofrido, mormente por não exercer o álcool influência idêntica em diferentes indivíduos. Assim, a simples relação entre o estado de embriaguez e a queda fatal como causa para explicar o evento danoso, por si só, não é suficiente para elidir a responsabilidade da seguradora, com a consequente exoneração do pagamento da indenização prevista no contrato. A legitimidade da recusa ao pagamento do seguro requer a comprovação de que houve voluntário e consciente agravamento do risco por parte do segurado, revestindo-se o ato como condição determinante na configuração do sinistro para ensejar a perda da cobertura securitária, uma vez que não basta cláusula prevendo que a embriaguez exclui a cobertura do seguro." REsp 780.757-SP <http://www.stj.gov.br/webstj/processo/justica/jurisprudencia.asp?tipo=num_pro&valor=REsp 780757> , Rel. Min. João Otávio de Noronha, julgado em 1º/12/2009.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

PESCADOR BENEFICIADO PELO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA

Nossos Tribunais tem entendimento de que a ação de ínfima gravidade, que não fere e não ameaça o bem jurídico tutelado é passível de aplicação do princípio da insignificância. Referido princípio pertine aos crimes de bagatela, eis que são destituídos de qualquer valoração a merecer a tutela jurisdicional do Estado (fatos de mínima perturbação social) e, portanto, irrelevantes.

Assim decidiu recentemente o C. Superior Tribunal de Justiça:
“PRINCÍPIO. INSIGNIFICÂNCIA. PESCA. APETRECHO PROIBIDO. Consta da denúncia que o paciente foi flagrado ao pescar em represa mediante a utilização de uma rede de nylon, apetrecho de uso proibido. Vem daí a imputação do crime previsto no art. 34, parágrafo único, II, da Lei n. 9.605/1998. Anote-se que foram encontrados com ele apenas dois quilos de peixes de variadas espécies. Quanto a isso, vê-se da norma incriminadora que se trata de crime formal (crime de perigo abstrato), delito que prescinde de resultado danoso específico (no caso, ao meio ambiente). Porém, apesar de não se desconhecer que o enquadramento da lei de crimes ambientais no ordenamento jurídico brasileiro ainda é tema tormentoso a causar inúmeras discussões jurídicas, sobretudo quanto à configuração dos delitos penais nela insculpidos, chegando alguns a entender até que os princípios nela edificados, tais como os da prevenção e da precaução, sobrepõem-se aos próprios princípios penais de garantia ao cidadão, destaca-se que a hipótese em apreço resolve-se mesmo pela pouca invasão naquilo que a sociedade, mediante o ordenamento jurídico, espera quanto à proteção de sua existência, visto que há um mínimo de probabilidade de a conduta do paciente atingir o bem jurídico tutelado na espécie, a fauna aquática. Daí não se hesitar em consignar a presença da insignificância a ponto de, ao reconhecer a atipicidade material da conduta, conceder a ordem para trancar a ação penal por falta de justa causa.”
HC 93.859-SP, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 13/8/2009.

A aplicação desse princípio extingue a punibilidade e conduz necessariamente à absolvição do infrator.
Os romanos assim recitavam: de minimis non curat praetor, ou seja, “não é bom exemplo ocupar-se o varão grave com ninharias”.
Portanto, pequenas condutas que não afetam potencialmente o meio ambiente e não colocam em risco a função ecológica da fauna impõe a aplicação do princípio da insignificância, uma vez que a conduta dos agentes não alcançou relevância jurídica.
Por fim, esclarecemos que a aplicação desse princípio deve ser analisada no caso concreto, a fim de não se cometer exageros, causando impunidade.
Arnaldo Varalda Filho

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Decretação de ofício da prescrição

O pronunciamento de ofício da prescrição corresponde a uma das mais importantes novidades criadas pela Reforma do Processo Civil, através da Lei nº 11.280/2006, que provocou uma mudança radical em um dos mais antigos institutos do mundo jurídico.
O art. 3º da Lei nº 11.280/06 que alterou o parágrafo 5º, do CPC passando à seguinte redação: O juiz pronunciará, de ofício, a prescrição.”
Com a nova redação do art. 219 do CPC o legislador concedeu ao juiz o poder de decretar, de ofício, a prescrição, no entanto, ao não retirar do devedor a faculdade da renúncia, tornou o instituto totalmente incoerente, ou seja, assistemático.
Conforme acima mencionado, a alteração legislativa fez desaparecer uma das clássicas diferenças da prescrição com o instituto da decadência.
A decadência atinge o próprio direito e é passível de argüição de oficio pelo magistrado, sendo matéria de ordem pública, pois o interesse defendido ultrapassa o da outra parte, pertencendo à própria sociedade, que corre o risco de ferir a segurança jurídica e a paz social.
A prescrição, entretanto, atinge a pretensão do direito, de cunho patrimonial e que não tem relevância para a ordem pública, ou seja, a pessoa continua a ter o direito, mas não poderia buscar a tutela jurisdicional do Estado para resolver aquela questão, razão pela qual, sempre foi tida como matéria de defesa da outra parte.
A decretação de ofício da prescrição no campo dos direitos patrimoniais é contrária a história do instituto, não só no direito brasileiro, mas também em outros ordenamentos jurídicos que vedam categoricamente o reconhecimento ex officio da prescrição.
No Código Civil italiano, art. 2.938, reza expressamente que: “il giudice non può rilevare d’ufficio la prescrizione non opposta”.
No Código Civil português, art. 303: “o tribunal não pode suprir, de oficio, a prescrição; esta necessita, para ser eficaz, de ser invocada, judicial ou extrajudicialmente por aquele a quem aproveita, pelo seu representante ou, tratando-se de incapaz, pelo ministério público”.
O Código Civil argentino, no artigo 3.964 assim dispõe: “El juez no pudere suplir de oficio la prescripción”.
O Advogado e Professor, Alexandre Freitas Câmara, argumenta veementemente sobre a incoerência atual do instituto da prescrição, mencionando que esse fato contraria três valores constitucionalmente assegurados: isonomia, adequação, segurança jurídica. Entende também que a inconstitucionalidade da norma também ocorre porque ela invade desnecessariamente a autonomia da vontade, corolária da garantia constitucional da liberdade.
Fazendo uso desse entendimento, não nos parece razoável que um juiz possa decretar de ofício a prescrição se o prescribente não quer que lhe aproveite. Logo, restaria violado o princípio constitucional de liberdade (autonomia da vontade).
Ainda em relação a inconstitucionalidade da norma, não podemos deixar de mencionar sobre o princípio do contraditório (art. 5º, LV, da CF), que será violado, caso o juiz conheça de oficio a prescrição sem dar a oportunidade das partes se manifestarem a respeito.
Portanto, se o juiz entende ter decorrido o prazo prescricional e as partes nada falaram a respeito, deve ele, dar essa oportunidade, pois o poder do juiz de conhecer uma matéria de ofício não lhe autoriza a dispensar o contraditório.
O Professor Carlos Scarpinella Bueno, em sua obra, Curso Sistematizado de Direito Processual Civil, 2ª ed., vol. 2, deixa expresso que a apreciação oficiosa da prescrição não deve ser admitida, pois o juiz prescindiria do estabelecimento do prévio contraditório.
Argumenta ainda sobre a possibilidade de haver alguma peculiaridade no caso que interfira na consumação da prescrição, por exemplo, nos caso de suspensão ou interrupção (arts. 197 e 205 do Código Civil), ou mesmo em caso de renúncia do interessado (arts. 191 e 940 do Código Civil).
Grande parte da doutrina entende que a alteração da norma viola o princípio do contraditório e que a nova legislação tornou o sistema incoerente, tendo em vista que passa a admitir que o juiz conheça de oficio a prescrição, mas continua a permitir que a mesma seja objeto de renúncia.
Todos sabemos que a intenção do legislador foi solucionar as pilhas e pilhas de processos que avolumam as prateleiras do Poder Judiciário, eis que o juiz poderá, verificada a prescrição, decidir rapidamente, desafogando o trabalho.
No entanto, não devemos esquecer que a prestação jurisdicional do Estado não tem qualquer relação com a efetiva entrega da tutela jurisdicional, pois há muito tempo o Judiciário tem-se preocupado mais com a quantidade de sentenças que profere do que com sua qualidade, e isso pode ser facilmente percebido nas estatísticas, onde não se tem um estudo sério sobre a qualidade.
Entendemos que a decretação, de ofício, da prescrição não deve ser admitida sem antes o juiz propiciar o contraditório e ampla defesa; observar as hipóteses de interrupção e suspensão da prescrição; verificar a hipótese de renúncia expressa ou tácita e ainda, em caso de direito patrimonial disponível, tentar a conciliação, objetivando a pacificação do conflito.
A prescrição sempre foi tratada como matéria de defesa do devedor, eis que fundada em uma tradição histórica de que as obrigações nasceram para serem cumpridas e a inadimplência manchava o nome do devedor junto a coletividade, sendo que a lei material e a lei processual inibiam a decretação de ofício da prescrição de direitos patrimoniais, aguardando uma atitude honrosa do devedor. Logo, a obrigação inexigível, acaso adimplida, resgataria a honrabilidade pessoal do devedor.
Portanto, ao aceitarmos a possibilidade do pronunciamento ex officio da prescrição, nos moldes do parágrafo 5º, do art. 219, do CPC, estaríamos sendo condizentes com a violação de interesses legítimos, tanto do credor quanto do devedor, ou seja, estaríamos privando-os do livre exercício de direitos materiais e ainda, negando-lhes o contraditório e ampla defesa.
Arnaldo Varalda Filho

quinta-feira, 28 de maio de 2009

O DANO ESTÉTICO É APENAS MAJORANTE DO DANO MORAL?

A doutrina nos ensina que o dano estético pode ser entendido como aquele que atinge o aspecto físico da pessoa humana, mediante modificação permanente ou duradoura em sua aparência, implicando um afeamento em sua imagem.
O dano moral constitui uma lesão aos direitos da personalidade, como por exemplo a liberdade, à opção sexual, à opção religiosa, bem como, entendemos que o dano moral causa a pessoa dor, tristeza, amargura, sofrimento, angústia e depressão. Logo, constitui aquilo que a pessoa sente.
Não entendemos que o dano estético sirva apenas para majorar o dano moral, pois referido dano é ocasionado na imagem, implicando em lesão à beleza física, enquanto que o dano moral ocorre quando há lesão aos direitos da personalidade, ou seja, quando ocorre um sofrimento intimo.
Cabe ressaltar que há entre as Turmas do Superior Tribunal de Justiça entendimento no sentido da possibilidade de cumulação de danos materiais, morais e estéticos quando oriundos do mesmo fato e passíveis de apuração em separado. (STJ – 4ª T - REsp 435371/DF, rel. Min. Fernando Gonçalves, j. 07.04.2005 v.u.).
Sobre o tema em discussão, o Professor Flávio Tartuce em sua obra Direito Civil, 2° vol., 3° ed., pág. 420 ensina que:
“Vislumbra-se no dano estético uma terceira modalidade de dano. O Superior Tribunal de Justiça vem entendendo que o dano estético é algo distinto do dano moral, pois há no primeiro uma ‘alteração morfológica de formação corporal que agride a visão, causando desagrado e repulsa’. Já no dano moral há um “sofrimento mental – dor da mente psíquica, pertencente ao foro íntimo. O dano estético seria visível, “porque concretizado na deformidade” (STJ, REsp 65.393-RJ, Reel. Min. Ruy Rosado de Aguiar e REsp 84.752-RJ, Min. Ari Pargendler).”
Portanto, a doutrina e jurisprudência entendem que o dano estético é uma modalidade separada de dano extrapatrimonial e não apenas uma majorante do dano moral.
Dr. Arnaldo Varalda Filho
advogado

sábado, 16 de maio de 2009

Acidente do Trabalho. Responsabilidade Objetiva pela Teoria do Risco da Atividade.

A responsabilidade civil decorrente de acidente do trabalho está amparada por expressa previsão constitucional, mais precisamente no artigo 7º, inciso XXVIII, onde preceitua que são direitos dos trabalhadores o seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenização a que este está obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa.

O Código Civil traz como regra geral a responsabilidade subjetiva em nosso ordenamento jurídico, sendo que para haver indenização se faz necessária a comprovação da culpa genérica, além da comprovação do efetivo dano e do nexo de causalidade.

Devemos esclarecer que a culpa civil em sentido amplo (sentido lato) abrange não somente o ato ou conduta intencional, o dolo, mas também os atos ou condutas praticados com negligência, imprudência ou imperícia, qual seja, a culpa em sentido estrito.

No entanto, o parágrafo único do artigo 927 do Código Civil, trouxe inovação à responsabilidade civil decorrente de acidentes do trabalho:

“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.” (grifamos)

Pela norma acima mencionada, o Juiz ao analisar o caso concreto deverá verificar, pela natureza do trabalho desenvolvido, se aplicará a chamada teoria do risco da atividade.

O Prof. e Jurista Sílvio de Sálvo Venosa assim ensina, em sua obra Direito Civil, 5 ed., Responsabilidade Civil, IV vol., pág. 25:

“A teoria do risco aparece na história do Direito, portanto, com base no exercício de uma atividade, dentro da idéia de que quem exerce determinada atividade e tira proveito direto ou indireto dela responde pelos danos que ela causar, independentemente de culpa sua ou de prepostos. O principio da responsabilidade sem culpa ancora-se em um princípio da equidade: quem aufere os cômodos de uma situação deve também suportar os incômodos. O exercício de uma atividade que possa representar um risco obriga por si só a indenizar os danos causados por ela.”

Portanto, o parágrafo único, do artigo 927 do Código Civil trouxe ao ordenamento jurídico uma norma aberta para a responsabilidade objetiva, realçando a discricionariedade do Juiz, que deverá analisar caso a caso e verificar a aplicabilidade da teoria do risco.

Existem diversos julgados no Direito Civil Brasileiro aplicando a teoria da responsabilidade objetiva com base nos valores da dignidade da pessoa humana e da solidariedade, em decorrência da grande dificuldade da parte hipossuficiente fazer sua prova, principalmente nas relações de consumo, de trabalho e em relação ao meio ambiente, pois quem tem o dever de cuidado, deve assumir os riscos da sua atividade.

Portanto, nas hipóteses em que a atividade do autor do dano implicar riscos, ele é responsabilizado independentemente de sua vontade, ou seja, não há que se perquirir de dolo ou culpa.

Cabe ressaltar, que o Enunciado nº 38 do Conselho da Justiça Federal, esclarece que a responsabilidade fundada no risco da atividade configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que aos demais membros da coletividade.

A jurisprudência vem reconhecendo a aplicação da teoria do risco em caso de acidentes do trabalho, o que nos parece justo, em razão do princípio da equidade, pois quem aufere lucros de uma situação deve também suportar os prejuízos.

Por fim, devemos ressaltar, que o Código inovou, apresentando norma aberta para a responsabilidade civil, razão pela qual transfere para a jurisprudência a conceituação de atividade de risco no caso concreto.

O importante é que em um sistema aberto o profissional do Direito poderá utilizar todos os conhecimentos doutrinários e jurisprudenciais para convencer o Magistrado, pois as cláusulas gerais permitem uma permanente formulação de novas normas.

sexta-feira, 15 de maio de 2009

RECISÃO. COMPROMISSO. COMPRA E VENDA. ESBULHO.

A questão está em saber se, diante de compromisso de compra e venda de bem imóvel com cláusula resolutória expressa, pode haver ação direta de reintegração de posse após notificação da mora, com deferimento de liminar, ou se há necessidade de prévia resolução judicial do pré-contrato. O Min. Relator destacou que este Superior Tribunal preconiza ser imprescindível a prévia manifestação judicial na hipótese de rescisão de compromisso de compra e venda de imóvel, para que seja consumada a resolução do contrato, ainda que existente cláusula resolutória expressa, diante da necessidade de observância do princípio da boa-fé objetiva a nortear os contratos. Por conseguinte, não há falar em antecipação de tutela reintegratória de posse antes de resolvido o contrato de compromisso de compra e venda, pois, somente após a resolução é que poderá haver posse injusta e será avaliado o alegado esbulho possessório. Diante disso, a Turma conheceu em parte do recurso e, nessa parte, deu-lhe provimento para afastar a concessão da tutela antecipada. Precedentes citados: REsp 817.983-BA, DJ 28/8/2006; REsp 653.081-PR, DJ 9/5/2005; REsp 647.672-SP, DJ 20/8/2007; REsp 813.979-ES, DJ 9/3/2009; AgRg no Ag 1.004.405-RS, DJ 15/9/2008; REsp 204.246-MG, DJ 24/2/2003, e REsp 237.539-SP, DJ 8/3/2000. REsp 620.787-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 14/4/2009.